CAPÍTULO 6 TRANSFIGURAÇÃO DE CRISTO, NO TABOR, COM A PRESENÇA DE SUA MÃE SANTÍSSIMA. SOBEM DA GALILÉIA PARA JERUSALÉM. A UNÇAO FEITA POR MADALENA EM BETANIA.
A transfiguração
1099. Decorrera mais de dois anos e meio da pregação e milagres de nosso Redentor e Mestre Jesus. Aproximava-se o tempo marcado pela eterna sabedoria para voltar ao Pai, por meio de sua paixão e morte, e com ela deixar satisfeita a divina justiça e redimido o gênero humano.
A transfiguração
1099. Decorrera mais de dois anos e meio da pregação e milagres de nosso Redentor e Mestre Jesus. Aproximava-se o tempo marcado pela eterna sabedoria para voltar ao Pai, por meio de sua paixão e morte, e com ela deixar satisfeita a divina justiça e redimido o gênero humano.
Como todas as suas obras eram ordenadas à nossa salvação e ensinamento, cheias de divina sabedoria, determinou o Senhor, preparar alguns de seus apóstolos para o sobressalto que sua morte lhes iria produzir (Mt 26 , 31). Quis, antes, lhes mostrar glorioso, aquele corpo passível que depois veriam açoitado a crucificado. Vê-lo-iam transfigurado pela glória, antes de o ver desfigurado pelas dores. Pouco antes ele fizera esta promessa diante de todos, embora apenas para alguns, como refere o evangelista São Mateus (Mt tó, 28). Para isto escolheu um alto monte, o Tabor, situado no centro da Galiléia, a duas légua s d e Nazar é par a o oriente , subindo até seu cume . Co m o s trê s Apóstolos, Pedro, Tiago e seu irmão João, transfigurou-se diant e deles , como nar ram três evangelistas: Mateus (17 , 1-4) ; Marcos (9,1); Lucas (9,28). Acharam-se também presentes na transfiguração de Cristo, nosso Senhor, os dois profetas Moisés e Elias com ele falando sobre sua Paixão. Enquanto se achava transfigurado veio uma voz do céu que , em nome do eterno Pai, disse: Este é meu Filho muito amado em quem me comprazo; a Ele deveis ouvir.
A transfiguração e Maria 1100.
Não dizem os Evangelistas que Maria santíssima estivesse presente ao prodígio da transfiguração, mas tampouco o negam. Isto não pertencia à sua finalidade, nem convinha manifestar nos Evangelhos o oculto milagre com que se realizou. Para escrever esta história, a mim foi dado a compreende r o seguinte : ao mesmo tempo que alguns anjos trouxeram a alma de Moisés e Elias, a divina Senhora foi levada por seus santos anjos ao monte Tabor, para ver seu Filho santíssimo transfigurado, e realmente o viu. Ainda que nã o fosse necessário fortalecer a fé da Mãe santíssima como a dos apóstolos , pois nela estava confirmada e seguríssima, teve o Senhor muitos fins no prodígio da Transfiguração. Além disso , para su a Mãe santíssima havia outras razões particulares, para
Sexto Livro Cristo nosso Redentor celebrar tão grande mistério em sua presença. O que para os apóstolos era favor, para a Rainha e Mãe era como devido , sendo ela su a companheira e coadjutor a d a Redenção at é a cruz. Convinha, por esta graça, confortar sua alma santíssima para os tormentos que iria padecer. Ficando depois, por Mestra da sant a Igreja , dari a testemunho deste mistério. Seu Filho santíssimo não lhe iria ocultar o que , tão facilmente, lhe podia manifestar, pois lhe mostrava todas a s operações de sua alma santíssima. Seu amo r filial pela Mãe não lhe negaria este favor, quando não deixou de lhe fazer quantos lhe provavam seu terníssimo afeto . Pessoalmente, para a grande Rainha, resultava em maior excelência e dignidade. Por estas razões e outras muitas, que não é necessário referir agora, foime dado a entender que Maria santíssima assistiu a Transfiguração de seu Filho santíssimo e Redentor nosso.
Sexto Livro Cristo nosso Redentor celebrar tão grande mistério em sua presença. O que para os apóstolos era favor, para a Rainha e Mãe era como devido , sendo ela su a companheira e coadjutor a d a Redenção at é a cruz. Convinha, por esta graça, confortar sua alma santíssima para os tormentos que iria padecer. Ficando depois, por Mestra da sant a Igreja , dari a testemunho deste mistério. Seu Filho santíssimo não lhe iria ocultar o que , tão facilmente, lhe podia manifestar, pois lhe mostrava todas a s operações de sua alma santíssima. Seu amo r filial pela Mãe não lhe negaria este favor, quando não deixou de lhe fazer quantos lhe provavam seu terníssimo afeto . Pessoalmente, para a grande Rainha, resultava em maior excelência e dignidade. Por estas razões e outras muitas, que não é necessário referir agora, foime dado a entender que Maria santíssima assistiu a Transfiguração de seu Filho santíssimo e Redentor nosso.
Visão da Virgem 1101.
Durante o tempo em que se realizou este mistério, a Virgem viu, não apenas a humanidade de Cristo transfigurada e gloriosa, mas também a divindade, clara e intuitivamente. A graça feita aos Apóstolos, foi para ela muito maior e mais perfeita. Mesmo n a visão da glória do corpo, a todos manifesta , houve grande diferença entre a divina Senhor a e o s apóstolos. Eles, a princípio, quando o Senhor se retirou a orar , ficaram sonolentos , como diz São Lucas (9 , 32). Depois , ao ouvir a voz do céu , co m grande temo r caíram com o rosto por terra, até que o Senhor lhes falou e os levantou, como narra São Mateus Capítulo 6 (17, 6). A divina Mãe, porém, em tudo conservou-se inalterável , pois além de estar habituada a tantas e tão grandes graças, fôra repleta de novas disposições de iluminação e fortaleza par a ver a divindade. Assim, pôde ver o corpo transfigurado sem se ofuscar e sem sofrer o temor e desfalecimento que os apóstolos sofreram na parte sensitiva. A Mãe santíssima já vir a outras vezes o corpo de seu Filho santíssimo transfigurado, como acima disse*1*.
Nesta ocasião, porém, foi com novas circunstâncias que lhe produziram maior admiração inteligência e outros singulares favores Em igual proporção, foram os efeitos produzidos em sua alma puríssima, tendo saído desta visão , toda renovada , inflamada e deificada. Enquanto viveu em carne mortal, nunca perdeu as espécies desta visão da humanidade gloriosa de Cristo nosso Senhor. Serviu-lhe de grande consolo na ausência de seu Filho, enquanto não lhe foi renovada sua imagem gloriosa em outras visões, como veremos na terceira parte. Não obstante, foi também motivo para sentir mais as afrontas de sua Paixão, tendo-o visto como Senhor da glória.
Explicação da Transfiguração 1102.
Os efeitos que em sua alma santíssima produziu est a visão de Cristo glorioso, não se podem explicar humanamente. Ver , com tanto esplendor, aquela substância que o Verbo tomara de seu próprio sangue, que trouxera em seu virginal seio e alimentara com seu leite; ouvir a voz do Pai reconhecendo por Filho aquele que também era seu, dando-o por Mestre aos homens; a prudentíssima Mãe penetrava, agradeci a e louvava digna mente ao Todo-poderoso por todos estes mistérios. Fe z novo s cânticos com seus anjos, celebrando aquele dia tão festivo l-n°69S.851. Sexto Livro - Capítulo 6 para sua alma e para a humanidade de seu pilho santíssimo. Não me detenho em explicar outras coisas deste mistério, e em que consistiu a transfiguração do sagrado corpo de Jesus . Bast a saber, que seu rosto resplandeceu como o sol e suas vestes ficaram mais brancas que a neve (Mt 17, 2). Esta glória no corpo resultou da que o Salvador sempr e possui u em su a alma divinizada e gloriosa. Na Encarnação , fez o milagre de suspender os efeitos de glória que ela, permanentemente, devi a refletir sobre o corpo. Agora, na transfiguração, cessou, de passagem, aquele milagre, e o corpo puríssimo participou da glória da alma, sendo isso o esplendor e claridade vistos pelos que a assistiam. Terminada a Transfiguração, continuou o milagre de se suspender os efeitos da alma gloriosa. Visto que esta era sempre beatificada, foi também prodígio que o corpo recebesse apenas d e passagem, o que, normalmente , sempre deveria ter.
Última viagem de Jesus 1103.
Celebrada a Transfiguração, a Mãe santíssima foi trazida de volta à sua casa em Nazaré. Seu Filho santíssimo desceu do monte e veio encontrá-la, para se despedir de sua terra, e dirigir-se a Jerusalém onde deveria padecer na Páscoa, a última para o Senhor. Passados alguns dias saiu de Na zaré acompanhado de sua Mãe santíssima, dos apóstolos, discípulos e outras santas mulheres, percorrendo o centro da Galiléia e Samaria até chegar em Jerusalém na Judéia. O evangelista São Luca s descreve esta viagem dizendo que o Senhor, resolutamente, encaminhou-s e para Jerusalém (Lc 9,51). Partiu com alegre semblante e fervoroso desejo de sofrer, e voluntariamente oferecer-se pelo gênero humano. Não voltari a mai s à Galiléi a onde re alizara tantos prodígios. Ao sair de Nazaré , adorou a o eterno Pai agradecendo-lhe, enquanto homem, por ter, naquela casa e lugar, recebido a forma e ser humano que, pela salvação dos homens, ofereceria à paixão e morte. Nesta oração que não posso explicar com palavras , entr e outra s muitas , Cristo nosso Redentor disse estas:
Oração de Cristo 1104.
Meu eterno Pai, para vos obedecer vou, com alegria e boa vontade, satisfazer vossa justiça e padecer até morrer para reconciliar convosco todos os filhos de Adão (Rom 5, 10). Pagarei a dívida de seus pecados, e abrir-lhes-ei as portas do céu que estes tinham fechado. Vou à procura das almas que, deixando-me s e perderam (Lc 19 , 10) , e se hão de salvar pela força de meu amor. Vou reunir os dispersos da casa de Jacó (Is 56, 8), erguer os caídos, enriquecer os pobres, refrigerar os sedentos, derrubar os soberbos e exaltar os humildes. Quero vencer o inferno e enaltecer o triunfo d e vossa glória contra Lúcifer (Uo 3 , 8 ) e os vícios que semeou no mundo. Quer o arvorar o estandarte da cruz, sob a qual hão de milita r todas as virtudes e quantos a seguirem (M116,24). Quero saciar a sede de meu coração pelos opróbrios (Tren 3, 30) e afrontas, a vossos olhos tão estimáveis. Quero humilhar-me até receber a morte da mão de meus inimigos, para que vossos amigos e escolhido s sejam honrados e consolados em suas tribulações, exaltados com eminente e copiosa recompensa, quando a meu exemplo se humilharem a padecê-las (FHp 28), 221 Sexto Livro - Capítulo 6
Oh! cruz suspirada, quando me receberás em teus braços? Oh! doces opróbrios e dolorosas afrontas, quando me levareis à morte para deixá-la vencida em minha carne (Heb 2,17) que em tudo foi inocente? Dores , opróbrios, ignomínias, açoites, espinhos, paixão, morte, vinde a mim que estou à vossa procura; deixai-vos logo encontrar por quem vos ama e conhece vosso valor. Se o mundo vos aborrece eu vos cobiço. Se ele, ignorante, vos despreza, Eu que sou a verdade e sabedoria, vos procuro porque vos amo. Vinde, pois, a Mim, receber-vos-ei com o homem, e como Deus vos darei a honra que vos tirou o pecado e quem o comete. Vinde a Mim e não frustreis meus desejos. Se não vos aproximais porque sou todo-poderoso, dou-vos licença para que em minha humanidade empregueis toda vossa ação. Não sereis por Mim repelidos, como fazem os mortais. Acabe-se o engano e ilusão dos filhos de Adão que servem à vaidade e à mentira (S I 4 , 3), julgando infelizes os pobres, aflitos e injuriados pelo mundo. Quando virem o seu verdadeiro Deus, Criador, Mestre e Pai padecer opróbrios, açoites, ignomínias, tormentos, desnudez e morte de cruz, acabará o erro e terão por grande honra seguir seu Deus crucificado.
Incoerência dos homens 1105.
Estas são algumas das razões que me foi dado a entender brotavam do coração do Mestre da vida, nosso Salvador. A realidade dos fatos manifestaram o que minhas palavras não conseguem exprimir: o valor que via nos sofrimentos , na paixão, na morte e na cruz e o amor com que as desejou. Mesmo assim, nós, criaturas terrenas, não abrandamos o coração e não deixamos a vaidade (SI 4, 3). Tendo diante dos olhos a vida e a verdade, sempre so mos arrastados pelo deleite, avessos, ao que é penoso. Oh! lamentável erro! Trabalhar tanto para fugir de pequeno trabalho, cansar-se demasiado por não aceitar pequeno incômodo, preferir estultamente sofrer uma ignomínia e vergonha eterna, a padecer uma insignificante, e mesmo por nào se privar de uma honra vã e aparente! Quem dirá, se tiver são juízo, que isto é amar-se a si mesmo? Ofendendo a Deus, nos prejudicamos mais, do que nos poderiam lesar as perseguições do inimigo. Consideramos inimigo aquele que, debaixo de lisonjas e carícias, nos arma traição, e louco seria quem, sabendo, se entregasse a esta, por causa do pequeno deleite daqueles. Se isto é verdade, onde está o juízo dos seguidores do mundo? Quem lho roubou? Quem lhes estorva o uso da razão? Oh! quão grande é o número dos néscios (Ecle 1,15)!
Oração de Maria 1106.
Somente Maria santíssima, imagem viva de seu Unigênito, foi a única entre os filhos de Adão que se ajustou perfeitamente à sua vontade e vida, sem discordar um ponto de todas suas obras e doutrina. El a foi a prudentíssima, plena de ciência e sabedoria, que pode compensar as falhas de nossa ignorância ou estultice, alcançando-nos a luz da verdade, para iluminar nossas densas trevas. Na ocasião de que vamos falando, aconteceu que a divina Senhor a viu no espelho da alma santíssima de seu Filho, todos os atos e afetos interiores que ele fazia. Como essa visão era a norma de suas ações, acompanhou-o naquela oração ao eterno Pai, dizendo interionnente: Deus 222 Sexto Livro - Capítulo 6
altíssimo e Pai das misericórdias, adoro teu ser infinito e imutável. Louvo-te e glorifico-te eternamente porque neste lugar, depois de me haver criado , tua benignidade se dignou elevar-me à Mãe de teu Unigênito, com a plenitude de teu espírito. Comigo, tua humilde escrava, enalteceste tuas antigas misericórdias. Sem Eu o merecer, teu unigênito e meu na humanidade que recebeu de minha substância, dignou-se conservar-me em sua companhia, tão desejável, por trinta e três anos. Durante este tempo gozei das influências de sua graça e magistério e de sua doutrina que iluminou o coração de tua serva. Hoje, Senhor e Pai eterno, deixo minha terra e acompanho meu Filho e meu Mestre para cumprir tua vontade e assistir ao sacrifício de sua vida pelo gênero humano. Não há dor que se iguale a minha dor (Tre 1 » 12), pois hei de ver entregue aos lobos sanguinários o Cordeiro que tira os pecados do mundo (Jer 11,19); aquele que é a viva imagem de tua substância (Sab 7,26; Heb 1,3 ) gerado abaeterno e por todas as eternidades igual a ela; aquele, a quem Eu dei o ser humano em meu seio, verei entregue aos opróbrios da morte de cruz, e desfigurada pelos tormentos a beleza daquele rosto (Is 53, 2) que é a luz de meus olhos e a alegria dos anjos. Oh! se fora possível eu sofrer as penas e dores que o esperam, e me entregar à morte para poupar sua vida! Recebe, Pai altíssimo, o sacrifício que com teu amado te oferece meu doloroso sentimento, a fim de que se cumpra tua santíssima vontade e beneplácito. Oh! que rápidos correm os dias e as horas, aproximando a noite de minha dor e amargura! Para a linhagem humana será dia feliz, mas noite de aflição para meu coração tão contristado com a ausência do sol que o iluminava.
altíssimo e Pai das misericórdias, adoro teu ser infinito e imutável. Louvo-te e glorifico-te eternamente porque neste lugar, depois de me haver criado , tua benignidade se dignou elevar-me à Mãe de teu Unigênito, com a plenitude de teu espírito. Comigo, tua humilde escrava, enalteceste tuas antigas misericórdias. Sem Eu o merecer, teu unigênito e meu na humanidade que recebeu de minha substância, dignou-se conservar-me em sua companhia, tão desejável, por trinta e três anos. Durante este tempo gozei das influências de sua graça e magistério e de sua doutrina que iluminou o coração de tua serva. Hoje, Senhor e Pai eterno, deixo minha terra e acompanho meu Filho e meu Mestre para cumprir tua vontade e assistir ao sacrifício de sua vida pelo gênero humano. Não há dor que se iguale a minha dor (Tre 1 » 12), pois hei de ver entregue aos lobos sanguinários o Cordeiro que tira os pecados do mundo (Jer 11,19); aquele que é a viva imagem de tua substância (Sab 7,26; Heb 1,3 ) gerado abaeterno e por todas as eternidades igual a ela; aquele, a quem Eu dei o ser humano em meu seio, verei entregue aos opróbrios da morte de cruz, e desfigurada pelos tormentos a beleza daquele rosto (Is 53, 2) que é a luz de meus olhos e a alegria dos anjos. Oh! se fora possível eu sofrer as penas e dores que o esperam, e me entregar à morte para poupar sua vida! Recebe, Pai altíssimo, o sacrifício que com teu amado te oferece meu doloroso sentimento, a fim de que se cumpra tua santíssima vontade e beneplácito. Oh! que rápidos correm os dias e as horas, aproximando a noite de minha dor e amargura! Para a linhagem humana será dia feliz, mas noite de aflição para meu coração tão contristado com a ausência do sol que o iluminava.
Oh! filhos de Adão, tão enganados e esquecidos de vós mesmos! Despertai de tão pesado sono e conhecei peso de vossas culpas, pelo que custaram ao vosso mesmo Deu s e Criador. Olhai meu delíquio, dor e amargura. Acabai de vos convencer do mal que é o pecado.
Partida de Nazaré para Jerusalém 1107.
Não posso dignamente manifestar todos os atos e conceitos que a grande Senhora do mundo fez nesta última despedida de Nazaré: suas súplicas e orações ao eterno Pai, os doces e dolorosos diálogos com seu Filho santíssimo, a grandeza de su a amargura, os incomparáveis méritos que adquiriu. Entre o amor santo e maternal de verdadeira mãe com que desejava a vida de Jesu se evitar-lhe os tormentos que havia de padecer, e conformidade com a vontade dele e a do eterno Pai - seu co ração era traspassado pela dor, daquela espada penetrant e que lhe profetizou Simeão (Lc 2,35). Nesta aflição, dizia a seu Filho palavras prudentíssimas, cheias de sabedoria, meigas e dolorosas, por não poder lhe evitar a Paixão, nem acompanhá-lo morrendo com Ele. Nestas penas ultrapassou, sem comparação, a todos os Mártires que existiram e existirã o at é o fim do mundo. Nestas disposições e sentimento, ignorados pelos homens, prosseguiram os Reis do céu e terra, a viagem de Nazaré a Jerusalém, através da Galiléia , onde não mais voltou o Salvador do mundo, em sua vida mortal. Como estava a terminar o tempo de trabalhar pela salvação dos homens , foram maiores os prodígios que fez nestes últimos meses, antes de sua paixão e morte, conforme é narrado pelos Evangelhos 223 Sexto Livro listas (Mt 13; Mc 10 ; Lc 9; Jo 7), desde a partida da Galiléia at é o dia de sua entrada triunfante em Jerusalém, como direi adiante(2). Até esta ocasião, depois da festa dos Tabernáculos, o Salvador esteve percorrendo a Judéia, aguardando o tempo marcado para se oferecer em sacrifício, quando e como Ele mesmo queria. Amor entre Filho e Mãe 1108. Nesta viagem, a Mãe santíssima acompanhou o sempre, salvo o tempo em que se separavam para acudir a diferentes obras em beneficio das almas. Nestas ocasiões, era acompanhada e servida por São João. Desde esse tempo, o santo Evangelista percebi a grandes mistérios e segredos da puríssima Virgem Mãe, sendo ilustrado com altíssima luz para entendê-los. Entre as maravilhas que a prudentíssima e poderosa Rainha operava, as principais e de maior caridade, consistiam em dirigir seus anseios e súplicas para a justificação das almas. Também Ela, como seu Filho santíssimo, fez maiores favores aos homens, trazendo muitos ao bom caminho , curando enfermos, visitando pobres, necessitados e desamparados. Ajudava-os a bem morrer, servia-os pessoalmente, principalmente aos mais abandonados, doentes e chagados. De tudo era testemunha o Discípulo amado que se encarregara de servila. A força do amor de Maria puríssima por seu Filho e Deus eterno crescera imensamente. Vendo-o agora prestes a se despedir para voltar ao Pai, sofria a Mãe beatíssima tão contínuos ímpetos do coração no desejo de o ver , que chegava a sentir amorosos desfalecimentos quando fek s e ausentava ou quando El e se de
- Capítulo 6 morava a voltar. O Senhor, como Deus e Filho, via o que acontecia à sua Mãe queridíssima. Correspondia-lhe com a mesm a fidelidade, dizendo-lh e interiorment e as palavras do s Cântico s qu e aqu i s e re alizaram literalmente : Feris.t e meu co ração, minha irmã , feriste-o com um dos teus olhos (Cânt 4, 9). Ferido e vencido por seu amor ia logo a seu encontro. Conforme entendi, Cristo , nosso Senhor, enquanto homem, não poderia ficar longe da presença de sua Mãe, se atendesse à intensidade da afeição que lhe dedicava, como Mãe que tanto o amava. Sua vista e presença O consolava; a beleza daquela alma puríssima dava-lhe prazer e tomava-lhe suaves os trabalhos e penalidades, dos quais Ela era o fruto, entre todos, único e singular . Su a amabilíssima presença era d e grand e alívi o para as penas sensíveis do Senhor.
- Capítulo 6 morava a voltar. O Senhor, como Deus e Filho, via o que acontecia à sua Mãe queridíssima. Correspondia-lhe com a mesm a fidelidade, dizendo-lh e interiorment e as palavras do s Cântico s qu e aqu i s e re alizaram literalmente : Feris.t e meu co ração, minha irmã , feriste-o com um dos teus olhos (Cânt 4, 9). Ferido e vencido por seu amor ia logo a seu encontro. Conforme entendi, Cristo , nosso Senhor, enquanto homem, não poderia ficar longe da presença de sua Mãe, se atendesse à intensidade da afeição que lhe dedicava, como Mãe que tanto o amava. Sua vista e presença O consolava; a beleza daquela alma puríssima dava-lhe prazer e tomava-lhe suaves os trabalhos e penalidades, dos quais Ela era o fruto, entre todos, único e singular . Su a amabilíssima presença era d e grand e alívi o para as penas sensíveis do Senhor.
Volta de Cristo à Betânia 1109.
Continuava nosso Salvador a realizar maravilhas na Judéia, entre elas a ressurreição de Lázaro na Betânia (Jo 11, 17) , onde veio a chamado das irmãs Marta e Maria . Muit o próxim o de Jerusalém, logo se divulgou ali o milagre, e os pontífices e fariseus, irritados com o prodígio, fizeram uma reunião para decretar a morte do Salvador (Jo 11,47). Ordenaram que, se alguém tivesse notícia d'Ele, o denunciasse, porque depois da ressurreição de Lázaro, Jesus retirara-se à cidade de Efren (Jo 11 , 54) até a festa da páscoa que não estava longe. Ao chegar o tempò de voltar a celebrá-la com a sua morte, abriu-se mais com os Apóstolos, dizendo-lhes que subiam a Jerusalém, onde o Filho do Homem seria entregue aos príncipes dos fariseus , para ser preso, açoitado e vilimpediado até a morte de Cruz Sexto Livro - Capitulo 6 (Mt20, 17 ; Mc 10,32; Lc 18,31; Jo 11,12). Neste Ínterim, andavam os fariseus atentos, à espreita de o ver subir a Jerusalém par a celebrar a Páscoa . Seis dias antes voltou a Betânia (Jo 12 , l)onde ressuscitara Lázaro . Fo i hospedado por suas duas irmãs que prepararam lauta ceia para Jesus e sua Mãe santíssima e todos os que os acompanhavam para a festividade da Páscoa. Um dos presentes à ceia foi Lázaro , ressuscitado poucos dias antes.
A unção por Madalena 1110.
Estando o Salvador reclinado à mesa , conforme o costume do s judeus, entrou Maria Madalena (Jo 12,3) repleta de luz divina e de elevados e nobilíssimos pensamentos . Com ardentíssimo amor por seu divino Mestre, derramou-lhe sobre a cabeça e os pés um frasco
de alabastro, cheio de precioso e fragrantíssimo perfume feito de nardo e outras substâncias aromáticas . Limpou-lhe os pés com os cabelos, como fizera em sua conversão, na casa do fariseu , conforme conta São Lucas (Lc 7 , 38). Os outros trê s Evangelistas (Mt 26,6; Mc 14,3; Jo 12,3) descrevem esta segunda unção, feita por Madalena, com alguma diferença. Todavia, não entendi que fossem duas unções, nem duas mulheres, mas só a Madalena, inspirada pelo divino Espírito e por seu inflamado amor por Cristo nosso Salvador A casa toda rescendeu com a fragrância desse unguento. Era bastante , muito precioso e a liberai e amorosa discípula quebrou o frasco para derramá-lo totalmente em honra de seu Mestre. O avarento apóstolo, Judas, que desejava tê-lo vendido para ficar com o dinheiro, começou a criticar a misteriosa unção. (Jo 12,5), contagiando alguns dos outros apóstolos , sob o pretexto de caridade para com os pobres. Dizia que se lesavam as esmolas, gastando tão prodigamente e sem proveito coisa de tanto valor. Na realidade, aquele ato fôra inspirado por vontade divina, enquanto ele não passava de hipócrita, avarento e insolente.
de alabastro, cheio de precioso e fragrantíssimo perfume feito de nardo e outras substâncias aromáticas . Limpou-lhe os pés com os cabelos, como fizera em sua conversão, na casa do fariseu , conforme conta São Lucas (Lc 7 , 38). Os outros trê s Evangelistas (Mt 26,6; Mc 14,3; Jo 12,3) descrevem esta segunda unção, feita por Madalena, com alguma diferença. Todavia, não entendi que fossem duas unções, nem duas mulheres, mas só a Madalena, inspirada pelo divino Espírito e por seu inflamado amor por Cristo nosso Salvador A casa toda rescendeu com a fragrância desse unguento. Era bastante , muito precioso e a liberai e amorosa discípula quebrou o frasco para derramá-lo totalmente em honra de seu Mestre. O avarento apóstolo, Judas, que desejava tê-lo vendido para ficar com o dinheiro, começou a criticar a misteriosa unção. (Jo 12,5), contagiando alguns dos outros apóstolos , sob o pretexto de caridade para com os pobres. Dizia que se lesavam as esmolas, gastando tão prodigamente e sem proveito coisa de tanto valor. Na realidade, aquele ato fôra inspirado por vontade divina, enquanto ele não passava de hipócrita, avarento e insolente.
Revolta de Judas 1111.
O Mestre da verdade defendeu Madalena a quem Judas repreendia de pródiga e irrefletida. Disse o Senhor, a ele e aos demais , que não a incomodassem (M126,10) porque aquele ato não era feito sem justa razão . Os pobres, por causa disso, não seriam privados das esmolas que lhes quisessem dar todos os dias, mas à sua pessoa nem sempre poderiam fazer aquele obséquio. Era a sua sepultura que a generosa e enamorada Madalena, 225 Sexto Livro - Capítulo 6 Inspirada pelo céu , estava prevenindo com aquela misteriosa unção. Testemunhava, assim, que o Senhor iria se sacrificar pelo gênero humano, e sua morte e sepultura estavam muito próximas. Nada disso, porém, entendeu o pérfido discípulo , encolerizando-s e contra seu Mestre por ter justificado o ato de Madalena. Vendo Lúcifer a disposição daquele depravado coração, lançou-lhe novas setas de cobiça, raiva e mortal ódio contra o Autor da vida. Desde esse momento, Judas decidiu maquinar a morte do Mestre desacreditando-o, junto aos fariseus de Jerusalém como realmente e com audácia o fez. As ocultas, procurou-os e lhes disse que seu Mestre ensinava leis novas, contrárias às leis de Moisés e dos imperadores; que era amigo de banquetes, de gente perdida e mundana; que acolhi a muitos homens e mulheres de má vid a e andava em sua companhia. Que os fariseus tratassem de ver isso, não viesse acontecer alguma tragédia que depois não pudessem remediar. Como os fariseus pensavam de igual modo, manejados, tanto eles como Judas, pelo príncipe das trevas, aceitaram o conselho, e combinaram a venda de Cristo nosso Salvador.
Obstinação de Judas 1112.
Todos os pensamentos de Judas eram conhecidos, não só do divino Mestre, mas também de sua Mãe santíssima. Nem por isto, o Senhor deixou de lhe falar como amoroso pai, e de lhe enviar ao obstinado coração santas inspirações. A estas, a Mãe de clemência acrescentou novas exortações e diligência s para im pedir o discípulo de cair no precipício. Naquela noite da ceia, que foi no sábado antes do domingo de Ramos ,
chamou-o em particular e com palavra de grande doçura, entre copiosas Iágrimas, lhe mostrou o tremendo perigo què corria. Pediu-lhe que mudasse de resolução, e se nutria rancor por seu Mestre que se vingasse n'Ela , pois seria menor mal, sendo Ela pura criatura, e Ele seu Mestre e verdadeiro Deus. Para saciar a cobiça daquele avarento coração , ofereceu-lhe alguma s coisas que para isso a divina Mãe recebera de Madalena. Nenhum a destas deligências, entretanto, foram capazes de abrandar o ânimo endurecido de Judas, nem tão vivas e suaves razões puderam impressionar seu coração mais duro que o diamante. Pelo contrário, não achando o que responder às justas palavras da prudentíssima Rainha, calou e se irritou ainda mais, mostrando-se ofendido. Mas, nem por isso, se envergonhou de aceitai* o que Ela lhe deu, pois era tão ambicioso quanto desleal. Deixando-o, Mari a santíssim a dirigiu-se a seu Filho e Mestre, e cheia de amargura e lágrimas atirou-se a seus pés. Procurou consolá-l o com grand e com paixão, pois via que sua humanidade santíssima se entristecia pelas mesmas razões que depoi s o fez dize r ao s discípulos: minha alma está triste até a morte (Mt 26, 38). Esta s penas eram produzida s pelos pecados dos homens que haviam de perder o fruto d e sua paixão e morte, como adiante direi ,
chamou-o em particular e com palavra de grande doçura, entre copiosas Iágrimas, lhe mostrou o tremendo perigo què corria. Pediu-lhe que mudasse de resolução, e se nutria rancor por seu Mestre que se vingasse n'Ela , pois seria menor mal, sendo Ela pura criatura, e Ele seu Mestre e verdadeiro Deus. Para saciar a cobiça daquele avarento coração , ofereceu-lhe alguma s coisas que para isso a divina Mãe recebera de Madalena. Nenhum a destas deligências, entretanto, foram capazes de abrandar o ânimo endurecido de Judas, nem tão vivas e suaves razões puderam impressionar seu coração mais duro que o diamante. Pelo contrário, não achando o que responder às justas palavras da prudentíssima Rainha, calou e se irritou ainda mais, mostrando-se ofendido. Mas, nem por isso, se envergonhou de aceitai* o que Ela lhe deu, pois era tão ambicioso quanto desleal. Deixando-o, Mari a santíssim a dirigiu-se a seu Filho e Mestre, e cheia de amargura e lágrimas atirou-se a seus pés. Procurou consolá-l o com grand e com paixão, pois via que sua humanidade santíssima se entristecia pelas mesmas razões que depoi s o fez dize r ao s discípulos: minha alma está triste até a morte (Mt 26, 38). Esta s penas eram produzida s pelos pecados dos homens que haviam de perder o fruto d e sua paixão e morte, como adiante direi ,
DOUTRINA DA RAINHA DO CÉU MARIA SANTÍSSIMA.
Pela cruz à glória 1113. Sexto Livro - Capitulo 6 Minha filha, continuando a escrever a história de minha vida, cada dia vais compreendendo melhor o ardentíssimo amor com que meu Senhor e tu, abraçamos o caminho da cruz e do sofri mento, o único que escolheu na vida mortal. Já que recebes esta ciência que Eu sempre te repito, é razão que trabalhes por imitá-la. Esta dívida vai crescendo parati, desde o dia que te escolheu por Esposa. Aumentando sempre, não a podes solver se não abraçares os trabalhos, e se não os amares com tal afeto, que para ti a maior pena seja o não padecê-los. Cada dia, renova em teu coração esta ciência ignorada e detestada pelo mundo. Ao mesmo tempo, adverte, porém, que Deus não quer provar a criatura apenas para a afligir, mas sim para tomá-la capaz e digna dos benefícios e tesouros que, por este meio, lhe prepara e ultrapassam todo humano pensamento (ICor 2 , 9). Em fé da referida verdade e como penhor dessa promessa, quis se transfigurar no Tabor, na presença minha e de alguns discípulos. Na oração que ali fez ao Pai, e que só Eu conheci e entendi, adorou-o por verdadeiro Deus , infinito em perfeições e atributos, conforme costumav a fazer quando queria lhe dirigir algum pedido. Em seguida , suplicou que os corpos mortais, que por seu amor e à sua imitação se mortificassem e sofressem, na nova lei da graça, participassem depois da glória de seu corpo; e, para dela gozar no grau que cada qual merecesse, fosse ressuscitado no dia do juízo final e unido à própria alma. Concedeu o eterno Pai este pedido. Confirmou-o como por um contrato entre Ele e os homens , mediante a glória do corpo de seu Mestre e Salvador , penhor da que pedia para todos seus seguidores. Tanto valor como este adquire o momentâneo trabalho (Cor 4,17) dos mortais ao se privarem dos deleites terrenos, mortificando sua carne e padecendo por Cristo, meu Filho e Senhor. Paciência com as almas 1114. Em virtude dos méritos infinitos que Ele interpôs nesta petição, esta glória é coroa de justiça para a criatura. Tem direito a ela como membro da cabeça que lha mereceu , Cristo (2Tim 4 , 8). A união a Ele, porém, é efetuada pela graça e pela imitação no padecer ao qual corresponde o prêmio. Se qualquer sofrimento corporal terá sua coroa, muito maior será o de sofre r e perdoa r a s injúrias, retribuindo-as com benefícios, como nós fizemos com Judas. O Senhor não o excluiu do apostolado, não se mostrou indignado contra ele, e o esperou até o fim. Finalmente, pela própria malícia o infeliz acabou por se entregar ao demônio e se impossibilitar para o bem. Na vida mortal o Senhor é muito lento para se vingar, mas depois compensará a tardança com o rigor do castigo. Pois, se Deus suporta e espera tanto, quanto não deve um vil bichinho tolerar a outro de sua mesma natureza e condição? Por esta verdade, e com o zelo da caridade de teu Senhor e Esposo, deves regular tua paciência, tolerância e solicitude pela salvação das almas. Não te digo para tolerar o que for contra a honra de Deus, pois isto não seri a verdadeiro zel o pelo bem do próximo. Quero que aborreça s o pecado, mas ames as criaturas do Senhor; que sofras e dissimules o que se referir a ti, e trabalhes para, o quanto for possível, todas se salvarem. Não percas logo a confiança quando não vires o resultado , mas apresenta ao eterno Pai os méritos de meu Filho Santíssimo, a minha intercessão, a dos anjos e santos. Deu s é caridade, e estando nele, os bem-aventurados a exercitam a favor dos peregrinos na terra (Uo 4,16).
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